O autor do livro é PhD em história, atualmente trabalha como professor na Universidade Estadual da Flórida. Nesse livro ele faz uma abordagem dos conceitos do tema felicidade no decorrer da história da humanidade. Dois aspectos ficam marcados na leitura do livro: a maneira como nosso modo de entender e almejar a felicidade são determinados pelo contexto histórico em que vivemos; e como os critérios para se definir felicidade são cíclicos no transcurso do tempo, ou seja, alguns elementos importantes no conceito de felicidade surgem, desaparecem e retornam em algum período adiante.
A busca pela felicidade já aparece no primeiro livro de história do ocidente,“A História” de Heródoto. A palavra empregada nesse livro para significar felicidade era eudaimonia, quer dizer bom espírito, ou bom deus. Logo, a felicidade era considerada uma intervenção dos deuses, um destino.
Foi Sócrates quem primeiro adotou a pressuposição de que a felicidade está ao alcance do ser humano. Sócrates defendia que o hedonismo, a busca pela satisfação do desejo, não leva a felicidade. Ele pregava o contrário: a sublimação do desejo pela filosofia, como uma força para fluir a felicidade. Aristóteles adota a visão de Sócrates acrescentando que a felicidade humana é conseqüência da prosperidade e da virtude.
Ainda por volta do século IV a.C. surgem Epícuro e Zenão, criadores das escolas dos epicuristas e dos estóicos. Eles adotam a fórmula que define felicidade como o resultado da proporção dos desejos satisfeitos em relação ao desejo, mas com um autoconhecimento que leva a um pensamento sóbrio, que por sua vez determina a escolha desse desejo.
O império romano cria a idéia da felicidade associada à riqueza, a conquistas, e a bravura. Surge o falo como símbolo da felicidade, acrescentando ainda o caráter da fertilidade, da sexualidade e da sorte. Neste ambiente se descortina o cristianismo como possibilidade da substituição da felicidade momentânea dos prazeres mundanos.
O cristianismo mostra a possibilidade de redenção através do sofrimento, com a promessa de uma felicidade eterna, e não a terrena. Esses conceitos eram opostos a tudo que se conhecia até então como definição de felicidade. Os gregos, romanos e israelitas buscavam a felicidade na ausência ou, no máximo apesar do sofrimento, e, nunca, pelo sofrimento. Como compreender os mártires do cristianismo irem sorridentes a arena para serem devorados pelos leões?
Fortes pensadores deixaram a marca do cristianismo nos conceitos de felicidade da Idade Média. No século V, Santo Agostinho cria a teologia do pecado e estabelece que a felicidade está além de nosso controle, sendo exclusivamente um dom de Deus. No século IX surge o renascimento carolíngio e com ele a figura do livre-arbítrio, trazendo a idéia de que o homem pode escolher viver uma vida santa e atingir a felicidade pelo gozo do bem supremo. No século XIII São Tomas de Aquino retoma a metáfora da escada, já encontrada anteriormente no pensamento judaico e no livro de Gênesis (a escada de Jacó). A idéia predominante neste período era a de uma ascensão e o objetivo final, a felicidade, era alcançado cultivando a razão e a verdade, logicamente influenciada pela cristianização do pensamento.
O período do Renascimento traz de volta a felicidade para o campo terreno. Os filósofos dessa época resgatam o pensamento da Grécia clássica “recomendando o disciplinamento das paixões, o cultivo da virtude, o desenvolvimento da razão e a busca pela harmonia e pelo equilíbrio neste mundo e no próximo”. A medicina renascentista via a tristeza excessiva e a melancolia com o olhar de Aristóteles, colocando-as como uma doença e pensava em meios possíveis de curá-la, cogitando a ação do clima e da nutrição em nosso humor. Burton em 1621 publica A anatomia da melancolia e no mesmo período, Erasmo, em Elogio da loucura, considera a absoluta ignorância como uma possível felicidade. A Reforma de Martinho Lutero muda o relacionamento entre o homem e Deus, trazendo a responsabilidade religiosa para a consciência do indivíduo, mas colocando a tristeza como uma coisa demoníaca, com a volta da eudaimonia de Heródoto.
John Locke, em 1652, retoma do epicurismo o prazer e a dor como forças humanas, mas também é considera humana a liberdade em escolher o que era dor e prazer verdadeiros.
Aparece o Iluminismo, movimento intelectual que caracterizou o pensamento europeu do século XVIII, que traduz a questão “como ser salvo?” para “como ser feliz?” e levando a uma resposta aonde se chegaria apenas pelo esforço e pelo entendimento. O iluminismo teve grande influência na política da época, e até em nossos dias, pregando que se uma autoridade não é exercida em prol da felicidade de todos, certamente ela esta baseada na força ou na fraude.
Dois nomes se destacam na transição deste período, em relação ao tema felicidade: Rousseau e Kant. O primeiro afirmava que felicidade tinha que ser algo mais do que o prazer, que era apenas um sentimento transitório. Na opinião de Rousseau a infelicidade surge a partir da “desproporção entre nossos desejos e nossas faculdades” e o progresso da ciência só faz aumentar nossas possibilidades aumentando ainda mais nossas angústias. A solução estaria novamente no culto da virtude. Kant complementa essa idéia dizendo que quanto mais se dedicar ao desfrute da vida mais se vai estar afastado da felicidade. Devemos, segundo Kant, nos empenharmos em sermos merecedores da felicidade.
Num período de destruição de parte da Europa pelas guerras napoleônicas, nasce um movimento introduzido por Goethe e Byron, denominado de “mal do século”, levando uma geração inteira ao culto a tristeza e a melancolia, com alguma similitude com o cristianismo na esperança de que um sofrimento terreno levasse a uma compensação futura. Também acontecia, naquela época, uma incessante busca da felicidade pela fuga nas drogas e nas artes. Schopenhauer, o mais brilhante dos filósofos desse momento, via na contemplação das artes como uma temporária liberdade, apesar do seu pessimismo quanto à possibilidade do homem ser feliz.
Enquanto isto nos Estados Unidos, influenciados por Benjamin Franklin, criava-se a cultura do direito à busca da felicidade, redigida inclusive na Declaração da Independência por Thomas Jefferson em 1.776. O caminho para a felicidade envolvia a promoção da felicidade pública. A virtude entrava como elemento dessa busca. Jefferson declarou que: “A felicidade é o objetivo da vida, mas a virtude é o alicerce da felicidade”. Hume colocava que o motor da civilização era essa constante inquietação em busca da felicidade. Entretanto esse direito à busca da felicidade gerou uma escala sem precedente dessa busca, criando a cultura do capitalismo.
Num campo oposto, surge Hegel, com a crítica ao que chamava de necessidades inventadas e desejos moldados socialmente. Max e Engels criam o socialismo científico. Definem a felicidade do indivíduo como inseparável da felicidade de todos, nesses termos muito semelhantes ao da libertação coletiva do cristianismo, e trazem do classicismo grego a busca da felicidade pelo esforço do homem.
Enquanto isto Darwin espanta o mundo com sua teoria evolutiva. No que concerne à felicidade ele coloca que ela está ligada ao instinto social, que por sua vez teria levado o homem a sobrevivência, pois as tribos felizes sobreviveram melhores do que as descontentes.
No final do século XIX surgem as idéias de Nietzche, reafirmando a virtude como o meio infalível de se obter a felicidade, mas a virtude como o uso da razão.
Freud, no início do século XIX, nos coloca que a frustração do homem na busca pela felicidade encontra-se na constante guerra do princípio do prazer, nossa força primitiva, com o princípio da realidade. Freud também fala de nossa tendência nata em nos contentarmos muito rapidamente com as conquistas do prazer (fato comprovado biologicamente muitos anos mais tarde). Ainda segundo Freud, o homem busca a felicidade através do hedonismo, do uso de drogas e do isolamento, mas que um caminho melhor era o de “tornar-se um membro da comunidade humana, e trabalhar pelo bem de todos”, e isto poderia ser obtido com o deslocamento da libido, ou do impulso sexual, para o trabalho produtivo e criativo, particularmente o intelectual e psíquico.
Depois de um período de perdas de esperança na felicidade com o fim da segunda guerra, na segunda metade do século XX, o mundo se vê inundado por campanhas publicitárias colocando a felicidade como um sonho possível de ser comprado. O direito a busca da felicidade passa pela possibilidade da busca e daí para a obrigação de sermos felizes. Entretanto a aquisição de poder de consumo não se sustenta como variável na aquisição da felicidade.
A identificação de fatores genéticos como determinantes na percepção da felicidade e em outros estados de humor dão uma resposta a muitas questões, mas ao mesmo tempo causam um temor do risco da manipulação genética como parte de um discurso da busca da felicidade acessível a todos. O progresso da ciência em desvendar os mecanismos e o tratamento da depressão e de outros transtornos mentais leva a um alivio àqueles que sofrem desses males, mas a dificuldade em se delimitar um padrão de normalidade e a linha divisória da doença, pode levar a busca de um corte acima do normal para se definir felicidade.
Finalizando o autor nos remete a pensar nos cavaleiros que buscam eternamente o “santo graal” da felicidade podem se deparar com o sentimento de não serem mais do que o cavaleiro Dom Quixote, de Cervantes, que “aprende no fim de suas andanças que o percurso é melhor que a chegada”.