O Caminho Tortuoso da Escada em Caracol

        Enio Braz

Desde a mais remota antiguidade, a Escada tem sido utilizada por vários povos como símbolo de ascensão, seja

moral ou espiritual. Sinónimo de verticalidade reata uma harmonia que foi quebrada pela separação na génese do mundo, a escada é um meio ou instrumento de evolução pessoal e de ascensão espiritual. Uma escada de sete degraus aparece em um vaso de barro da 3ª Dinastia de Ur, de aproximadamente 2070 anos AC, a qual sugere uma iniciação, conduzindo dos níveis inferiores da consciência aos níveis superiores. Na mitologia Egípcia temos a escada de Rá, que une a terra ao céu. Simbologismo semelhante pode ser encontrado na Escada de Jacob, ao longo da qual subiam e desciam os anjos de Deus, segundo a narrativa bíblica. Por ser muito utilizada como símbolo de desenvolvimento espiritual e de ascensão, a Escada acabou sendo introduzida na simbologia maçônica, tanto no Grau de Aprendiz, com a Escada de Jocob, como no Grau de Companheiro, com a Escada em Caracol ou em Espiral.

         Já no primeiro grau, ao Aprendiz é feito ver que sua evolução na senda iniciática requer esforço e dedicação, pois o aperfeiçoamento que deseja implica na necessidade de dominar o lado fraco de sua natureza, bem como na escalada de um determinado número de degraus, simbolizados pela Escada de Jacob. Segundo a narrativa bíblica, a escada vista em sonho por Jacob representa o veículo que dá acesso à morada de Deus. Para a Maçonaria ela representa o caminho que conduz à perfeição, seus degraus representam as virtudes necessárias ao aperfeiçoamento individual. Na maçonaria especulativa primitiva esses degraus eram representados por apenas três virtudes: Fé, Esperança e Caridade. Posteriormente foram acrescentados mais quatro degraus, representando as virtudes cardeais: Temperança, Fortaleza d’alma, Prudência e Justiça. Hoje, entende-se que os degraus da escada de Jacob, são em número proporcionais às virtudes necessárias ao aperfeiçoamento individual, e o número de degraus varia de pessoa para pessoa, de acordo com o seu estágio de evolução e aperfeiçoamento.

         Do ponto de vista maçônico, o Aprendiz caminha de um estado de imperfeição, como “Pedra Bruta”, rumo à perfeição, ou seja, das trevas para a luz. Ascender na escada de Jacob, não é simplesmente galgar cada um dos graus maçônicos, não tem a ver com a ascensão física do maçom por seus degraus (erroneamente quando um Maçom passa de um grau para outro superior é dito: “subiu mais um degrau na escada de Jacó”), a ascensão é do espírito em busca de aperfeiçoamento e perfeição.

         No Segundo Grau, o Companheiro Maçom compreende que já não está mais preso a um único caminho na busca do conhecimento e da verdade, daí que em sua marcha desvia seus passos, obliquamente, ora para a direita, ora para a esquerda. A ele é feito ver que o caminho que deve trilhar para atingir a perfeição não é retilíneo e constante, mas tortuoso e cheio de dificuldades. Para tanto, a maçonaria serve-se também de uma alegoria de origem bíblica: a Escada em Caracol. No primeiro livro dos Reis vemos o seguinte: “A porta do andar inferior encontrava-se do lado direito do edifício. Subia-se por uma escada em caracol ao andar do meio e deste ao terceiro” l Reis, 6,8.

         No Grau de Companheiro é onde o obreiro adquire o máximo de conhecimentos, aprende a ciência maçônica passando a trabalhar com novas ferramentas de trabalho, preparando-se para entrar no Grau de Mestre. Simbolicamente, nesse grau, ele deve girar em torno de si mesmo, absorvendo tudo em sua volta e atingindo, além disso, níveis superiores,  cada vez mais aperfeiçoados. Assim, ao atingir o Grau de Mestre que é o esplendor da sua carreira maçônica, o obreiro poderá começar a transmitir seus conhecimentos adquiridos, ou iluminar, clarear, a mente dos novos Aprendizes e de todos com os quais convive.

         A Escada em Caracol está presente no Painel da Loja de Companheiro, formada por três lances de três, de cinco e de sete degraus. Os três primeiros degraus correspondem ao Prumo, o primeiro, ao Nível, o segundo e ao Esquadro, o terceiro, simbolizando, respectivamente, os três graus da Maçonaria Simbólica: Aprendiz, Companheiro e Mestre. Cada um dos cinco degraus seguintes corresponde a um dos cinco sentidos humanos: audição, olfato, visão, paladar e tato. Embora falíveis e, portanto, nem sempre confiáveis separadamente, mas fortes quando juntos, os sentidos funcionam como verdadeiros guardiões a nos indicar os perigos presentes em qualquer caminhada. O Companheiro aprimora os cinco sentidos humanos em sua plenitude para, então, aprender a dominar as sete artes e ciências liberais.

         Os cinco degraus representam também as cinco ordens nobres da arquitetura antiga, a Jônica, a Dórica, a Coríntia, a Compósita e a Toscana, as três primeiras de origem Grega e as duas ultimas de origem Romana. As de origem Grega são mais antigas e originais, possuem maior destaque, pois por suas colunetas representativas de cada ordem estão relacionadas ás três principais divisões do Templo Maçônico: Oriente, Coluna do Norte e Coluna do Sul. A Ordem Jônica é conhecida como a Ordem de Atenas, e por isso é representativa da Sabedoria, seu lugar é no Oriente, junto ao Venerável Mestre. A Ordem Dórica é a ordem arquitetônica mais rústica das três gregas, prioriza a robustez em detrimento da beleza e é comumente vista nos templos dedicados a deuses masculinos, relacionada com a Força, representada no templo pela Coluna do Norte, governada pelo Primeiro Vigilante. A Ordem Coríntia é a mais bela de todas as ordens arquitetônicas, procura reproduzir a delicadeza feminina, está relacionada com a Coluna do Sul. Já a Ordem Toscana é derivada da Dórica, e a Ordem Compósita é derivada da Jônica e Coríntia.

     Os sete últimos degraus representam as sete artes liberais da antiguidade: Gramática, Retórica, Lógica, Aritmética, Geometria, Música e Astronomia. Elas sugerem ao Companheiro a necessidade da cultura e do conhecimento em sua escalada evolutiva para atingir a Luz, um caminho em que é necessário, a Cultura, o Conhecimento, o equilíbrio, a retidão, a dialética e a harmonia, sugerido pelas sete artes.

         A Escada em Caracol representa as grandes dificuldades que o Companheiro encontra para estudar, compreender e aprender tudo o que é necessário para alcançar o grau de Mestre.Por ser em espiral (caracol) ela simboliza o caminho tortuoso e difícil que o iniciado deve trilhar para atingir a perfeição, simboliza o deslocamento obrigatório do corpo, que o Companheiro deve realizar sobre si mesmo, para atingir o topo da Escadaria, no sentido esotérico é a "visão para dentro", em busca dos sentidos espirituais e das ciências esotéricas.

         Nenhuma evolução, nenhum progresso existe sem que ajam obstáculos a serem superados, em grau maior ou menor de dificuldades. Assim, a coragem, perseverança, a paciência, entre outras, são virtudes que o Companheiro já deverá ter absorvido durante o seu período de aprendizado, para que possa suportar os empecilhos que encontrará na sua ascendente trajetória. A escada no segundo grau significa que a evolução, em geral, não se desenvolve numa progressão retilínea constante, matematicamente invariável, mas por etapas, em ciclos ascendentes ou em espiral, cujas volutas vão se alargando cada vez mais até se confundirem com o infinito. Para o seu auto aperfeiçoamento o Companheiro Maçom deve buscar incessantemente, mais luz e conhecimento, em uma espiral, passo a passo, em sua escalada ascensional do grau inferior para o superior.

         A Escada em Caracol simboliza, portanto uma penosa e dramática marcha feita de avanços e de recuos, de quedas e de ascensões, de derrotas e de triunfos rumo à Câmara do Meio, onde o Companheiro receberá o seu salário pelo esforço e determinação e aguardará a glória de ser reconhecido como verdadeiro Mestre Maçom.

Ir,’, Enio Braz

C.’.M,’, A,’,R,’,L,’,S,’, Március da Anunciação Dias 3430 GOB

Divinópolis, Abril 2014

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